segunda-feira, 5 de fevereiro de 2024

 

Investigação na Abin tem indícios contra suspeitos e lacunas

As decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, sobre a atuação da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no governo Jair Bolsonaro (PL) trazem até o momento indícios de irregularidades, mas ainda deixam lacunas sobre como se deu na prática a atividade da “Abin paralela”. Com base em três determinações judiciais do ministro, no inquérito conduzido pela Polícia Federal (PF), percebe-se que, após a primeira fase, a investigação ampliou o foco: antes era o uso ilegal do FirstMile e passou a mirar relatórios e informações produzidos supostamente a pedido, que a PF batizou de “núcleo político”, cujo único nome apontado até agora é o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos/RJ).

Como as decisões de Moraes incluem apenas trechos dos pedidos da PF, outros elementos de prova e indícios podem estar nos apensos e nas representações do delegado do caso, ainda mantidos em sigilo. A investigação envolve a compra e o uso do software FirstMile, que fornecia, segundo a PF, dados de localização de pessoas de forma ilegal, sem autorização judicial; a elaboração de supostos relatórios de inteligência contra adversários políticos de Bolsonaro por parte de servidores da Abin; o uso da Agência para fins pessoais da família do ex-presidente da República; e a suposta tentativa da atual cúpula da Agência de atrapalhar as investigações.

O FirstMile utiliza uma brecha no protocolo internacional das telecomunicações, chamado de SS7 (Sistema de Sinalização nº 7), que atua quando uma pessoa liga para o celular de outra e as redes precisam saber em qual antena o interlocutor está. Ele é instantâneo e a conexão entre os dois aparelhos é estabelecida quando uma informa à outra a localização com base na antena mais próxima.
Empresas de inteligência usam uma brecha e criam empresas de telecomunicação de fachada para pedir às operadoras reais a localização de celulares. Assim, quem compra a ferramenta pode incluir o telefone de qualquer pessoa na plataforma e fazer o monitoramento.
A PF afirma que ele invade a rede de telefonia e cita como indício uma troca de e-mail entre representantes da empresa vendedora do software e um servidor da Abin. Em janeiro de 2020, a funcionária da Cognyte afirma que estava “pesquisando e testando novos métodos para acessar” à rede da Tim porque havia sido barrada pela operadora.
Além disso, a PF, segundo mostra a decisão, afirmou que a análise preliminar do banco de dados do programa indicou a existência de 60.734 pesquisas, com retorno com a geolocalização em 21.309 buscas. O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, afirmou em entrevista que 30 mil pessoas foram alvo do software. A Abin teria utilizado a ferramenta de fevereiro de 2019 a abril de 2021.
A PF diz que dois servidores demitidos estavam respondendo a processo disciplinar por terem participado ilegalmente de licitação e ameaçavam denunciar o uso do FirstMile se isso acontecesse. De acordo com o inquérito, Alexandre Ramagem, então chefe da Abin, agiu para livrar os servidores da punição e, assim, evitar a divulgação da ferramenta.
Na primeira decisão de Moraes, há trecho em que a PF indica o “núcleo de pesquisas” na Abin. São 12 servidores identificados até outubro de 2023 como os responsáveis por executar a inclusão dos números na ferramenta.
Não há detalhes, no entanto, de quem seria o responsável por cada pedido e se os oficiais da Abin sabiam de irregularidades. A Polícia Federal indica indiretamente Ramagem como solicitante em um caso, mas não mostra como chegou a essa conclusão. A PF também fala de policiais federais que estavam em um setor chamado Centro de Inteligência Nacional (CIN), mas não é possível saber o motivo

Nenhum comentário:

Postar um comentário